Puta ou Pura? Só eu sei.
Eu cresci ouvindo que o amor é puro e o sexo é sujo. Que quando a gente ama não deseja mais ninguém. Que traição é falta de caráter. Que mulher para casar é bela, recatada e do lar. Que para conhecer o verdadeiro amor incondicional deveria ter filhos. Que meu corpo era algo para reservar somente aos mais íntimos. Que ser transparente era exposição e que mostrar demais é coisa de mulher vulgar.
Eu cresci sentindo vergonha de ser quem eu sou. Culpa por sentir esta energia e vontade pulsantes que passeiam em minhas veias. Raiva de mim mesma por não ter a aparência da capa da revista. Nojo por não ter o comportamento correto caso quisesse ser digna de amor. Inveja de todas aquelas tão doces e delicadas boas meninas merecedoras de tudo o que há de belo e de bom.
Eu cresci acreditando que havia algo de errado comigo. Que eu deveria amar um e somente um pelo resto de minha vida. Que eu não podia ter amigos se almejava ter um marido. Que eu tinha que me esconder do mundo e viver somente para ele. Que se aquele relacionamento não desse certo eu não valia nada. Que desejar algo ou alguém mais era luxúria, gula, coisa de puta.
Eu cresci fazendo de tudo para me encaixar. Lutando dia após dia para ser uma boa namorada, boa filha, boa aluna, boa irmã, boa amiga e até boa de cama e sei lá mais o quê. Tudo menos boa para mim mesma. Estudando de comunicação a sexualidade para me relacionar bem com todos. Para atrair. Para conquistar. Para agradar. Para cuidar. Para tudo. Menos para mim mesma.
Eu cresci pensando que estava corrompida por aquele garoto. Que no dia em que ele me tocou, quando mais ninguém havia tocado, eu havia me tornado descartável, um lixo, impura e suja. Que se a ele, um qualquer, dei a permissão de fazer o que fez comigo, então um namorado teria tudo de mim. Quando, onde e como desejasse. Ainda assim, eu não o seria suficiente. Não importa o quanto tentasse.
Então um dia eu entendi que não preciso mais tanto me esforçar. Eu tenho todo o direito de recomeçar. Do meu jeito. Amando mais de um ao mesmo tempo. Mas primeiro a mim mesma. Com o cabelo que eu quiser, a roupa que eu quiser, o esmalte que eu quiser, o sapato que eu quiser. A postura e atitude que eu desejar. Da forma que eu tiver vontade. Do jeito que fizer sentido para mim.
Eu aprendi que não há boas maneiras, regras de etiqueta, bons costumes, manual de instruções para o amor. Muito menos receita de bolo ou fórmula mágica. Existem dois indivíduos, ou mais, que juntos constroem a própria relação e realidade. Com os princípios de cada um e que, para mim, são amor, verdade e liberdade. Os quais nós podemos sempre descobrir algo novo e mudar. Jamais se moldar e se perder.
Eu decidi questionar o status quo e provocar uma transformação na minha vida. Terminar um quase-casamento, voltar para casa, para mim mesma, para minha essência. Ficar com quem me der na telha, me apaixonar, me entregar, me descobrir, me elaborar. Curtir minha juventude, meter o pé na jaca, escapar na madrugada, caminhar sem rumo, comprar um fumo, beber de um tudo.
Não para preencher nenhum vazio existencial, e sim para me experimentar e me permitir. Por mim. Inteira. Livre. Leve. Solta. Feliz. Porque faz sentido. Porque sim. Simples assim. Sem necessidade de provar ou explicar nada para ninguém. Apenas viver e compartilhar esta existência tão rara quão comum com quem estiver afim. E quem não estiver que se afaste. Só não ouse me colocar em sua caixa.
Eu escolhi fazer, pensar e sentir diferente. Olhar para frente. Escutar minha intuição. Acreditar nas vozes da minha cabeça. Seguir meu coração. Eu disse sim para mim. E passei a sustentar meus nãos. Impor meus limites. Satisfazer minhas vontades e necessidades. Me despedir de tudo e todos que não me representam mais. Me despir para, finalmente, olhar para mim. Nua. Puta ou Pura? Só eu sei.